segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Cine Olympia

Publicamos mais uma crônica de Amílcar Carneiro, originalmente publicada na sessão Coisa de Cinema, da Revista Independente de Castanhal, entre os anos de 2006 e 2007. 

O texto foi escrito em meio às discussões sobre o fechamento do Cine Olympia, de Belém (que graças à pressão popular, não aconteceu!). O autor fala sobre a onda de fechamento de cinemas de rua que veio ganhando força a partir dos anos 60 e 70, chegando ao estopim nos anos 80. A crônica apresenta a visão de um exibidor sobre a extinção de vários cinemas e retrata a tensão e o debate em torno da iminência do fim do cinema hoje considerado o mais antigo do Brasil em funcionamento.

Com vocês, mais um "Coisas de Cinema"!


Cine Olympia

Quem leu minha página na edição anterior sabe que me comprometi a contar causos de vivência em cinema, mas não podia perder a oportunidade de registrar este momento histórico que é o fechamento do cine Olímpia em Belém, o mais antigo do Brasil em funcionamento. Esta frase ``o mais antigo do Brasil em funcionamento``, longe de ser um elogio, mostra muito bem o que tem acontecido com outros tantos cinemas maiores ou mais importantes que o Olímpia pelo Brasil afora.
Na década de 1960, grandes cinemas que fizeram história em Belém fecharam suas portas melancolicamente, Moderno, Independência e Art. Em Manaus, os melhores cinemas da cidade deram lugar a magazines surgidos com a zona franca. Nos anos setenta o fechamento em massa dos maiores cinemas do país localizados no eixo Rio São Paulo dava inicio a era dos multiplex, cinemas geminados, pequenos, confortáveis e com diversidade de programações.
Na década seguinte, 1980, o vendaval de fechamentos de cinemas se arrastou pelas capitais e pelo interior, Em Manaus, de novo cinco salas que homenageavam ícones da sétima arte cerraram sua portas, Cines Oscarito, Grande Otelo, Chaplin e Carmem Miranda. Em Belém, Palácio e Paraíso deram lugar a igreja Universal. Em Fortaleza os cines Diogo, Jangada e São Luis, cinemas de grande porte, deram lugar a outros tipos de comércio. Em Recife, Trianon, Arte Palácio, Veneza e Moderno, todos de luxo, com mais de mil lugares, renderam-se a nova realidade fechando por falta de público.
Alguns cinemas sobreviveram exibindo filmes pornô, como o Cine Passeio em São Luis e o Rex em Terezina, mas acabaram fechando por falta de matéria prima, ou seja, fitas pornô em 35mm. Neste estilo sobreviveu apenas o Cine Opera em Belém, único cinema do Brasil que ainda exibe pornô, e o motivo é que seu público cativo não vai ali para assistir filme. Mesmo assim o prédio está a venda, quem tiver 4 milhões de reais se habilite.
Mas, voltemos ao Olímpia... Cine Olímpia de saudosa memória. A primeira vez que ouvi falar nele tinha uns cinco anos de idade, minha mãe chegou com meu pai de Belém dizendo que tinha assistido um filme onde as pessoas saiam da tela, em um cinema cuja tela era de costas para a entrada. Era a maravilha da terceira dimensão em que o ilusionismo chega ao extremo e a impressão é que realmente as imagens saem da tela. Já era uma tentativa dos americanos de enfrentar a crise do cinema que por lá se instalava. Tudo nos EUA acontece trinta anos antes, ou mais.
Anos depois eu fui assistir no Olímpia ao famoso A Volta ao Mundo em Oitenta Dias, inaugurando as novas instalações da sala com central de ar condicionado e cadeiras estofadas que lhe valeu o título de cinema mais luxuoso do norte e nordeste do Brasil por alguns anos, com direito a exigir dos freqüentadores traje passeio. Ou seja, camisa de meia sem gola nem pensar. Isto era prática comum nos cinemas da época. Aqui mesmo em Castanhal não era permitido entrar de bermuda ou tamanco, depois foram sendo permitidos os trajes mais despojados como os tempos atuais exigem. Mas pra quem assiste em casa o filme que quer, por que se deslocar a um cinema mesmo em trajes de banho?
            Esse inevitável destino do Cine Olímpia sempre traz discussões, frases saudosas e até promessas políticas, a sociedade não aceita, governantes se dizem preocupados, o secretário de cultura pede mais tempo para diálogos. Mas só o proprietário é que sabe quanto custa manter a casa no vermelho. No caso do Cine Olímpia, o proprietário não é um exibidor qualquer, é o maior do Brasil em todos os tempos, ninguém menos do que a família Luis Severiano Ribeiro, dinastia que começou a construir seu império no inicio do século passado e sabe muito bem quando deve fechar ou abrir um cinema, Quem quiser manter o Olímpia intacto faça como a Igreja Universal, pague pra ver, ou manter, da maneira que melhor lhe convier.

Por Amílcar Carneiro

Texto originalmente publicado na Revista Independente (2006/2007)

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