domingo, 25 de outubro de 2015

O Cineasta de Castanhal

A paixão de Manoel Carneiro Pinto Filho pelo cinema se materializou no Cine Argus e em todo o extenso circuito de exibição que se formou a partir deste. As influências sobre a cidade de Castanhal são incalculáveis. As sobre seus descendentes, diversas. Destas, uma das mais evidentes são as que foram exercidas em Francisco Queiroz Carneiro, o sexto filho de Seu Duca e Dona Nila (ao lado de Inácia Maria Carneiro Thury, sua irmã gêmea) que se tornou fotógrafo profissional e cineasta, dono da Produtora Argus em Maputo, Moçambique.

Chico Carneiro, como viria a ser conhecido profissionalmente (ou Chico “Mou” para os mais íntimos), iniciou suas primeiras realizações cinematográficas por meio de uma câmera 8mm comprada por Seu Duca, que sempre investiu muito na formação artístico-cultural dos filhos. “Todo mundo queria ser ou artista ou cineasta”, relembra Amílcar Carneiro, filho de Seu Duca que assumiu a programação do Cine Argus após o falecimento do pai. “E ele incentivava, ele comprou filmadora. Na época era difícil, caríssimo, era difícil você ter uma filmadora como tem hoje. Filmadora 8mm, filmava aquela película muda, preto e branco, de 3 minutos, tinha que mandar revelar pra poder assistir. Mas a gente brincava de fazer filmes. Isso levou meu irmão, Chico Carneiro, que foi um dos que pegou mesmo a paixão pela filmadora... porque a filmadora veio passando de irmão pra irmão, né. O primeiro irmão que queria uma filmadora foi o Pedro. (...) passou pra mim, eu comecei a fazer uns filmes, a gente geralmente filmava desfile do dia da pátria, um banho de igarapé, essas coisas. As vezes filmava e nem tinha dinheiro pra mandar revelar, o filme se perdia por aí (...) e a câmera passando de mão em mão, quando chegou na mão do Chico Mou, aí pronto, começou a fazer filme mesmo, brincar no quintal pra aprender a trabalhar com atores, essa coisa toda. Já profissional desde cedo”, recorda Amílcar.


O jovem Chico "Mou" Carneiro sentado em frente aos cartazes do saguão de entrada do Cine Argus (1967). Época das primeiras experiências com a filmadora 8mm.

“O mais importante foi o apoio incondicional do meu pai ao meu desejo de ser cineasta. Eu não tenho uma formação acadêmica, tudo o que eu aprendi foi fazendo, e nos primeiros passos com o apoio integral do meu pai, seja comprando o equipamento, seja comprando a película, seja pagando a revelação das mesmas, e não questionando ou criando qualquer obstáculo para que eu seguisse a carreira de cinema. Muito pelo contrário, ele apoiou completamente”, relata Chico Carneiro, em entrevista concedida ao documentário Memórias do Cine Argus em 2012.

A primeira grande oportunidade profissional de Chico Carneiro veio na primeira metade dos anos 70, com o filme Iracema, uma Transa Amazônica, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, na qual Chico Carneiro atuou como assistente de câmera. Foi a porta de abertura para trabalhar como assistente de câmera e de som em outros filmes importantes, com destaque para Pixote, de Hector Babenco e ABC da Greve, de Leon Hirzsman. Em 1983, surgiu a oportunidade para se mudar para Moçambique, onde trabalha como fotógrafo e cineasta desde então, produzindo diversos filmes, especialmente documentários. As férias, curtidas no Pará, são utilizadas para fazer filmes em seu estado de origem. Em 2001, produziu Os Promesseiros. Nos últimos anos, dedicou-se a produzir uma pentalogia sobre os barcos que percorrem os rios da Amazônia Paraense transportando madeira, gado, pessoas, cerâmica e pescado, formada pelos documentários Seu Didico, Paraense Velho Macho; Balsa Boeira; Nos Caminhos do Rei Salomão; Nas Barrancas do Rio Cariá; e Pescadores de Água Doce.

 Pôster de Iracema, uma Transa Amazônica (1976)

 Cena de Seu Didico, Paraense Velho Macho (Chico Carneiro, 2008)


A participação de Chico Carneiro em Memórias do Cine Argus é muito maior do que sua aparição no filme. Sua agenda lotada e as diversas produções em curso não o impediram de contribuir substancialmente para o Memórias, seja por meio de sua entrevista (gravada pelo próprio e gentilmente enviada de Moçambique), seja por meio de críticas e cessão de imagens. Várias das fotografias presente no filme são de sua autoria. Não bastasse tudo isso, Edivaldo Moura, diretor de Memórias do Cine Argus, tem nos filmes de Chico Carneiro uma de suas principais referências para seus trabalhos. 
Chico "Mou" Carneiro em Memórias do Cine Argus (2014)

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Crítica de Memórias do Cine Argus no Kinoforum

Por ocasião da participação de Memórias do Cine Argus no 26º Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo, uma crítica super bacana sobre o filme foi publicado no site da Associação Cultural Kinoforum, entidade sem fins lucrativos que realiza atividades e projetos e apóia o desenvolvimento da linguagem e da produção cinematográfica com destaque para a promoção do audiovisual brasileiro. A crítica é de Rafael Dornellas. Reproduzimos abaixo.


Memórias do Cine Argus: generosidade com o passado

Cidade de Castanhal, Pará: uma fusão entre o desbotado prédio do antigo Cine Argus e uma loja de material de plástico é realizada sob o mesmo enquadramento nos primeiros instantes do curta-metragem. A diferença entre as imagens do velho e do novo é clara. Mais significativo do que sua aparência é aquilo que é produzido nos dois tempos fundidos na transição: em um deles, plástico; no outro, cinema. É desse contraste que Edivaldo Moura usufrui para dar vazão a seu filme, e seu resgate à memória.

Não é a monumentalidade do prédio que é colocada em questão. Não é um olhar monumentalizante. O choque inicial entre arcaico e moderno é necessário para que se construa a partir de então a personalidade do antigo, ou daquilo que restou das memórias passadas. Os frequentadores, funcionários, seguranças, idealizadores, e todas as pessoas que de alguma maneira tiveram alguma relação afetiva com o finado Cine Argus, têm seu depoimento registrado no filme. E esse é um dos pontos centrais de Memórias do Cine Argus: a relação de afetividade e de homenagem ao cinema, e particularizada neste local específico, é sempre mediado através de pessoas, de suas falas.

O caráter humano se faz ainda mais necessário uma vez que é estabelecido um embate crítico entre o arcaico e o moderno na primeira fusão citada acima. O olhar se volta para o passado, para o humano. O edifício de décadas atrás projetava filmes e resultava em um acontecimento social na interação entre os moradores da cidade. Já o prédio novo é frio, empresarial.

Não havia outra maneira de abordar esse cinema de rua que não essa, de entrega, de abertura sentimental, de uma percepção da necessidade e importância de preservação da memória. O olhar generoso para o passado e para o cinema faz desse um documento honesto acerca de um cinema de rua desativado, e também de um momento histórico para um pequena cidade do Pará.

Sem idealizações gratuitas, os depoimentos também carregam em sua impressão imagética o desgaste e reclusão pelo tempo. Antigas fotos dos rostos jovens são intercaladas às rugas do tempo presentes, e o ponto máximo da humanização desse olhar é o momento em que o filme se atém a falar sobre o seu Duca (idealizador do cinema de rua de Castanhal) e como sua morte representou o fim daquele cinema.

Então a reflexão: a defesa realizada pelos moradores da cidadezinha de um cinema que possua sua recepção presente em tela grande, em um ambiente em que haja interação coletiva, contrariamente à dispersão do vídeo. Há, nas memórias dos entrevistados, a indicação de uma razão social presente naquele cinema – a possibilidade de convívio que era estabelecida pela chegada de um novo filme em cartaz, e a constatação de acuamento e reclusão perante o mundo pós-moderno.


Ainda que a narração do diretor que abre e encerra o filme possa parecer romantizada por demais, ela expõe sua honestidade perante o Cine Argus da mesma forma que os moradores de Castanhal relatam sua relação com esse cinema, da mesma forma também que nos são revelados os diversos cartazes de filmes que passaram por ele, documentando e resgatando a memória – em que o antigo, se não é idealizado em relação ao moderno, nos parece uma opção mais humana, enraizada na experiência de participar de uma sessão no cinema assistindo a filmes de cinema.

Por Rafael Dornellas

Disponível em: http://kinoforum.org.br/criticacurta/memorias-do-cine-argus-generosidade-com-o-passado/

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Meninos Curiosos

"Meu irmão era operador. Eu gostava de ir observar, sempre fui curioso. E meu irmão dizia "olha, o Duca não gosta de ninguém aqui! Desce, desce, desce!". Quando foi um dia, Seu Duca vinha na escadaria e disse “ei, Chiquinho, não faz isso não. Deixe ele aí, que eu gosto de gente curioso assim. Quem sabe um dia ele não vai nos servir, pro cine argus”. O depoimento é de Ademar dos Santos, técnico do Cine Argus por décadas, que ainda se emociona ao falar do antigo cinema de rua de Castanhal e de Seu Duca, patrão e amigo de longo tempo.

Não é a toa que Seu Duca gostava de gente curiosa. Especialmente, de gente curiosa pelo cinema. Nascido em 1918, o garotinho Manoel (Duca), por volta de 6 anos, admirava o Cine Teatro Kosmos, que ficava em frente a casa de um farmacêutico com o qual morou durante um período de dificuldades financeiras de sua família, na cidade de Bragança. O que mais o encantava era o trabalho de preparação artesanal dos cartazes (que o inspiraria a fazer o mesmo com o Cine Argus) e o funcionamento da máquina de projeção. "Mas, não é que eu gostasse só de ver o filme na tela, o meu encanto era ver a máquina funcionando (...) Eu queria ver porque é que as pessoas andavam. Saber o porquê. Porque ele colocou a fita e tal, movimentava, aparecia lá na tela. Mas, eu olhava pra máquina e não via nada, só via a fita parada (...) E eu perguntava pro operador 'o que é que faz andar, hein?", afirma Seu Duca em entrevista concedida ao filho Chico Carneiro em 1977. Tanta curiosidade levou Seu Duca ao sonho de ter um cinema, o que conseguiu realizar em Castanhal, por volta de seus vinte e poucos anos.

Ademar dos Santos nos recebeu no ano de 2014, em meio à sua imensa coleção de vinis, em sua oficina, onde utiliza a intimidade de muitos anos com os equipamentos de projeção do Cine Argus para fazer consertos de eletrodomésticos. Do cinema onde trabalhou, guarda muita saudade. Afirma nunca ter pisado nas salas multiplex do Moviecom, no Yamada Plaza Castanhal. "Se eu for lá, eu sei que a lágrima vai descer, porque eu sinto saudade disso (...) dói você ta perto daquele equipamento que você lidava com ele desde criança, conhecer com a palma da sua mão... dói pra caramba", diz. 

                                                                                      Ademar dos Santos, em Memórias do Cine Argus (2014)

Nosso entrevistado relatou que seu primeiro serviço no Cine Argus foi como ajudante em uma pintura do prédio. O rapaz curioso foi em seguida contratado como faxineiro. De faxineiro, passou para revisador. De revisador para operador. E de operador se tornou o técnico da empresa, quando tinha entre 19 e 20 anos. 

Das várias histórias curiosas contadas na entrevista de Ademar dos Santos há uma que diz respeito ao momento em que o Grupo Severiano Ribeiro deixou de fazer a distribuição de filmes para os cinemas do interior do Pará, na segunda metade dos anos 60. "Quando foi véspera de natal, seu Duca foi lá (em Belém), tava cortada a programação do interior, dele e do meu primo em Capanema. Rapaz, nesse dia eu vi esse homem chorar. Aí ele disse “Ademar, o que eu faço?” Era o dia de, depois da projeção, sair a gratificação para cá um dos funcionários. Eu disse “não, seu duca, não se perturbe não, que pra tudo tem um jeito, Deus dá um jeito pra tudo", relembra Ademar. A solução para o problema não podia ser mais criativa e contou com o improviso dos dois. Seu Duca pediu a Ademar que tentasse montar um filme a partir de restos de película existentes no forro do prédio, para salvar a renda do Natal.

"Naquele tempo, o público era um ou outro que entendia de cinema. Era escolhido o público seleto para compreender", relata Ademar. "Então eu disse 'eu vou montar um filme aqui, pra não ficar sem filme no natal'. Emendei um bocado de partes, umas quatro partes. “E aí, que nome é?” (perguntou Duca). “Ah, não tem nem nome isso aí”. Eu pensei “ah, poe aí... Rua da Saudade (RISOS).  Aí ele fez a placa e disse “Rapaz, você tem uma cabeça...”. Aí começou. Eu ouvia o povo dizer "rapaz, eu vou embora, que eu não sei que diabo de filme é esse!". Mas, arranjou o dinheiro pra dar a gratificação de cada um e ainda sobrou o dinheiro da passagem pra ele ir pra Recife no dia seguinte. Dia de natal ele viajou pra Recife pra tentar a programação direto de Recife pra Castanhal. E conseguiu", lembra Ademar. 

Depois desse fato, Seu Duca estimulou a reaberta de diversos cinemas no interior do estado do Pará, criando um circuito exibidor com mais de 30 salas de cinema. Adquiriu equipamentos de vários cinemas do sudeste do Brasil, que estavam fechando suas portas frente à concorrência com a televisão, para servir às suas praças. Os anos 70, marcados pelos faroestes, foram um período áureo para o recém criado circuito da Empresa Argus. O menino curioso que queria ter um cinema agora tinha mais de 30. E o outro garoto curioso que gostava de observar o projetor, se tornaria o técnico responsável por diversos projetores dessas praças. 

sábado, 17 de outubro de 2015

2 Filhos de Francisco no Cine Argus?

O que o sucesso de bilheteria nacional 2 Filhos de Francisco, lançado no ano de 2005, tem a ver com o Cine Argus, que fechou suas portas em 1995, dez anos antes do lançamento do filme que contou a história de Zezé di Camargo e Luciano? Acredite, tem mais a ver do que você imagina.

 Cena do filme 2 Filhos de Francisco (Direção: Breno Silveira, 2005)

O Cine Argus tem muitas boas histórias, tantas que várias ficaram de fora de nosso documentário de curta-metragem e devem permanecer fora do longa. Uma delas diz respeito à dupla sertaneja mirim Mirosmar e Emival, que fizeram uma passagem pelo Cine Argus e quase chegaram a se apresentar nele, antes do trágico acidente que tiraria a vida de Emival.

Quem nos conta essa história é Amílcar Queiroz Carneiro, o filho de Seu Duca que assumiu o comando da empresa Argus depois que o pai faleceu. Em entrevista ao filme Memórias do Cine Argus, em 2014, Amílcar relatou que, por ocasião de um show que a dupla Zezé di Camargo e Luciano fez na Feira Agropecuária de Castanhal, no ano de 2009, o cantor Zezé havia pedido a um dos organizadores do evento para que passassem em frente ao cinema onde havia se apresentado com seu irmão Emival antes do acidente que havia matado seu irmão, pois gostaria de rever o prédio. O referido organizador era um conhecido da família Queirós Carneiro e contou o fato a Amílcar, que então se lembrou de um episódio que ocorreu nos anos 70, quando um empresário e dois garotos procuraram Seu Duca para fazer uma apresentação no Cine Argus.

"Eu estava chegando no cinema, e tinha dois garotos vestidos com roupas iguais. aparentando uns 10 anos, e o empresário deles conversando com meu pai. Eles queriam fazer uma apresentação no Cine Argus pra ganhar um dinheiro e pagar o hotel. Eles estavam em um hotel aqui em Castanhal e a bagagem deles estava presa", lembra Amílcar. Segundo este, Mirosmar (Zezé) e Emival não chegaram a se apresentar, pois Seu Duca achava que não ia dar público. Mas, mandou que Amílcar acompanhasse o empresário e pagasse o hotel, por pena das crianças, para que pudessem seguir viagem. O empresário, impressionado com o ato de generosidade de Seu Duca, lhe fez muitos elogios e disse que falaria a seu respeito quando chegasse em Anápolis. É possível que tenha sido nessa viagem que tenha ocorrido o triste acidente que tiraria a vida do menino Emival.

 Cena do filme 2 Filhos de Francisco (Direção: Breno Silveira, 2005)

Tentamos contato com Zezé di Camargo por meio de seus perfis nas redes sociais, para confirmar a história, mas não obtivemos retorno. Sem dúvida, esta é mais uma das inúmeras histórias interessantes do Cine Argus.

E você, tem alguma história interessante pra nos contar, relacionada ao Cine Argus? Mande sua mensagem, adoraremos publicá-la!

Seu Sabá do Cinema

"Olha o roubo! Olha o roubo!" Quem nunca ouviu esses gritos no Cine Argus, quando cenas de ação sofriam saltos durante a projeção (muitas vezes nos momentos de maior tensão)? Quem senta em um poltrona de cinema não percebe o trabalho de preparação que existe antes da projeção do filme. No caso dos cinemas que ainda não aderiram à projeção digital, esse trabalho envolve a manipulação da película, material fotográfico de diversas bitolas utilizado para a gravação e projeção de filmes. Em se tratando dos cinemas de rua do interior, os rolos de películas dos longa metragens chegavam muitas vezes cheios riscos e remendas, em função de já terem circulado em diversos outros cinemas. E aí entrava o trabalho minucioso de fazer os reparos nos filmes antes das exibições, o que normalmente era feito pelo projecionista, que também cuidava da manutenção dos equipamentos.

O jovem Sebastião Guimarães, revisando a película (foto: Chico Carneiro).

Um dos mais importantes projecionistas do Cine Argus é Sebastião Guimarães, conhecido até hoje como Sabá do Cinema. Sebastião (ou Sabá) me recebeu em sua residência meio que de surpresa. Eu estava procurando o mesmo, após receber uma dica de sua localização no bairro da Cohab, em Castanhal, e felizmente o encontrei. Embora com certa timidez, Sabá foi se entusiasmando em falar do trabalho de décadas no cinema de Seu Duca, da dura jornada de trabalho nos dias de sexta-feira santa com as sessões do filme A Vida de Cristo, da generosidade do patrão, dos tempos de uma Castanhal sem violência (onde se podia trabalhar até tarde e depois caminhar a pé até sua casa sem ser oportunado) e, é claro, do trabalho igualmente recompensante e ingrato do projecionista.

Sabá, na marquise do Cine Argus (imagem: Lívio Carneiro, 1991)

"Eu gostava de trabalhar no Cine Argus por que eu via muita gente dentro do cinema. Era (os filmes) A Vida de Cristo, Rambo, Tarzan...", relembra com saudade. A alegria das pessoas o recompensava. Mas, a profissão também tinha o lado ingrato. Sabá sofria com os filmes que chegavam muito deteriorados ao Cine Argus e que consumia horas de trabalho minucioso para remendar. Era impossível evitar a perda de fotogramas. Às vezes, não obstante toda a dedicação, o filme quebrava. E as vaias comiam. "Tu é doido é, a gente só faltava apanhar!", exagera.

Décadas de dedicação na projeção dos filmes lhe renderam problemas de vista. Marcas cruéis de um tempo saudoso, de uma heróica testemunha ativa da saga de Seu Duca. O problema de visão lhe impediu de ir assistir ao filme Memórias do Cine Argus nas duas vezes em que foi exibido na Fundação Cultural de Castanhal. Mas não o impediu de o assistir em sua casa. E de fazer uma justa observação: "O filme contou só uma parte da história. Vixi, o Cine Argus foi muito mais que aquilo!". Nós sabemos, Sabá. E é por isso que nossa pesquisa continua.

Sebastião Guimarães (Sabá) em Memórias do Cine Argus (2012)

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Cine Argus Volta às Telas do Olympia

Memórias do Cine Argus está entre os 54 curtas-metragens selecionados (dentre 270 vídeos inscritos) para o III Festival Audiovisual de Belém, que ocorrerá no período de 29 de outubro a 01 de novembro de 2015. É a segunda vez que o documentário será exibido na tela do majestoso Cine Olympia. A primeira foi em fevereiro de 2015, na I Mostra Curta Pará de Cinema.

A programação completa será divulgada no dia 19 de outubro de 2015. Maiores informações sobre o III Festival Audiovisual de Belém podem ser obtidos no site do evento.



sábado, 3 de outubro de 2015

Muito Mais que um Cinema

Ao longo dos 83 anos da história da cidade de Castanhal, o Cine Argus esteve presente durante quase 60 anos, levando entretenimento, informação e cultura à sociedade, e prestando serviços à mesma através da cessão de seu auditório e de seus auto-falantes a diversos eventos locais. O Cine Argus movimentou a vida cultural da cidade de Castanhal e influenciou várias gerações. Sua história, portanto, está intrinsecamente relacionada à história dessa cidade. O resgate de suas memórias representa, nesse sentido, ao resgate de parte significativa da história e da cultura de Castanhal, o que condiz com um dos objetivos da política municipal de cultura preconizados no Plano Diretor Participativo de Castanhal: “Promover o resgate da memória como um bem cultural e como forma de transformação social e política”.
Mas... o que foi de fato o Cine Argus? O que o Cine Argus fez pela nossa cidade? O Cine Argus foi tanta coisa... e fez tanta coisa! Pra começar, ele foi um cinema. No Cine Argus assistimos seriados e, muito antes das novelas, sofremos com a expectativa do próximo capítulo. “Será que o mocinho vai conseguir escapar dessa? Não percam o próximo episódio!”. E é claro que ninguém perdia.
O Cine Argus nos fez amar os filmes de faroeste! Quisemos ser os personagens vividos por Giuliano Gemma e John Wayne. E nos fez apaixonar! Marylin Monroe, Brigitte Bardot, Sônia Braga. James Dean, Tom Cruise, Marlon Brando. Projetamos nossas estrelas do cinema na pessoa sentada ao nosso lado e vivemos inesquecíveis romances. Quantos namoros começaram no Cine Argus!
O Cine Argus também nos fez querer brigar. Pelo menos, de brincadeira. Quem nunca tentou imitar os golpes dos filmes de karatê, ser Bruce Lee, Stalone Cobra, Rocky Balboa, O Último Dragão Branco de Van Damme, Braddock, Rambo, Conan e diversos outros personagens dos filmes de ação? E quem nunca quis ser um jedi? Aliás, quem é que não ficou de queixo caído quando Darth Vader disse ao Luke Skywalker: “eu sou seu pai”?
O Cine Argus nos fez rir, e rir demais! Nos apresentou clássicos das chanchadas, com Oscarito, Grande Otelo e companhia. E quantas filas gigantescas se formaram dobrando o quarteirão, por causa de um único motivo. Aliás, de quatro: Didi, Dedé, Mussum e Zacarias. Que crianças felizes nós fomos com os Trapalhões!...
O Cine Argus fez parte de nossas tradições religiosas. Programa obrigatório da semana santa de todo católico que se prezava. Quantas vezes assistimos A Vida de Cristo, ano após ano, e com a mesma empolgação? A maior bilheteria de todos os tempos do Cine Argus era o maior milagre de Cristo, como dizia Seu Duca.
E o cinema de Seu Duca trazia as notícias do Brasil e do mundo também. Alguém lembra dos cinejornais Atlântida? E de quantas vezes vibramos com os gols do Canal 100?
Mas, o Cine Argus também nos fez sentir medo. Que o digam as garras do Freddy Krueger e o terçado do Jason, que não importava o quanto você corresse, ele ia só na manha e sempre te alcançava! E pra nos socorrer de todos os nossos temores, só mesmo Os Caça-Fantasmas!
Quem não se lembra da sua primeira sessão no Cine Argus? Eu lembro da minha. Aliás, se eu tivesse que elencar as coisas que me mais me encantaram ao longo da vida, certamente que dentre elas estaria aquela inesquecível tarde de domingo na qual eu mergulhei meus olhos no telão do Cine Argus pela primeira vez. A Volta dos Mortos Vivos II. Se hoje eu sou fascinado por zumbis e não perco um só capítulo de The Walking Dead, a culpa é do Cine Argus.
O Cine Argus nos aproximou da cultura nipônica e foi muito importante para a integração da colônia japonesa em nossa cidade através da exibição de diversos filmes japoneses, nos dando o deleite de apreciar a magnífica fotografia dos filmes de Akira Kurosawa.
O Cine Argus mexeu com nosso sentidos. Imperou sobre nossos sentidos. E falando em Império dos Sentidos... Quem não esperou ansiosamente por completar 18 anos para pode entrar nas sessões de terça e quarta-feira? E quem não tentou entrar antes disso? Numa época em que o acesso aos conteúdos eróticos não era banalizado e que uma atmosfera de mistério, curiosidade e proibição – que sempre torna a coisa mais gostosa! – pairava sobre os filmes pornôs, o Cine Argus embalou as fantasias de muitos jovens... Como diria o Pati: “tinha muito muleque perverso!”.
Mas, o Cine Argus não era apenas uma sala de exibição. Na verdade, o Cine Argus era muito mais do que um cinema! O Cine Argus era um ponto de encontro. Era o point pra muita coisa que acontecia na cidade. Durante os 83 anos de Castanhal, o Cine Argus foi a principal referência cultural por quase seis décadas. Estaria com 77 anos se ainda existisse. Seu auditório abrigou peças de teatro e shows musicais (por aqui estiveram Luiz Gonzaga, Jerry Adriani, o Palhaço Carequinha e vários outros) e também sediou reuniões de sindicato, convenções partidárias e outros eventos solenes.
Seus auto-falantes levaram música, informação, recados e outros serviços de utilidade pública. E deram suporte à realização dos desfiles de 7 de Setembro e aos bailes de carnaval na Avenida Barão do Rio Branco.  
Por meio de sessões promocionais, diversos jovens conseguiram custear formaturas e viagens para participação em eventos. E não dá pra esquecer dos célebres shows de calouros das manhãs de domingo, nos quais diversos jovens castanhalenses alimentaram seus sonhos de se tornarem estrelas da música. Ou, pelo menos, de ganhar brindes e se deliciar com os pães da Panificadora Atlântida.

(trecho do discurso de Edivaldo Moura, antes da exibição de Memórias do Cine Argus na Funcast. 29/05/2015).

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Memórias do Cine Argus no Sercine

Ocorreu ontem, dia 1º de outubro de 2015, a abertura do 5º SERCINE - Festival Sergipe de Audiovisual, que ocorre em Aracaju até o próximo dia 10 de outubro.

Memórias do Cine Argus deverá ser exibido no dia 08 de outubro de 2015, as quinze horas, no Teatro Lourival Batista, na Mostra Competitiva Universitária.


Memórias do Cine Argus no I FESTICINI 2

O I Festival de Cinema Independente - I FESTICINI continua ganhando manchetes de jornal. Memórias do Cine Argus está na mostra competitiva, concorrendo a melhor documentário de curta-metragem.

Dos 33 filmes selecionados para o festival, 18 são brasileiros. As outras produções são provenientes da Suécia, França, Alemanha, Polônia, Espanha, Portugal, Bélgica, Luxemburgo, Grécia, Irã e Reino Unido, além de co-produções entre África do Sul e Dinamarca e entre Austrália e Polônia. O I FESTICINI será realizado na cidade de Sumaré - SP, de 17 a 31 de outubro de 2015.