Você sabia que o Palhaço Carequinha já se apresentou no Cine Argus? Que já teve hipnotizador fazendo sucesso na cidade, dando cursos de hipnose no cinema do Seu Duca? E que o Cine Argus passou por uma enorme reforma, sem parar de funcionar, com filmes exibidos com o teto do cinema descoberto, com todos torcendo para que não chovesse? Essas histórias são contadas na divertida crônica de Amílcar Carneiro.
Cine Argus em reforma, em 1967 (Foto: Chico Carneiro)
- Ta certo ou não tá?
E a platéia respondia em coro:
- Ta sim sinhô...
Esse era o mote preferido do
palhaço Carequinha, consagrado artista de circo, rádio (gravou vários sucessos
musicais), televisão e cinema. Nascido em família circense, seu nome de batismo
era George Savalla Gomes, aos doze anos já era palhaço.
Ingressou na TV desde seus
primórdios, mas só em 1956 chegaria ao cinema com a comédia Com Água na Boca. Seguiram-se outros
sucessos como Sai de Baixo, Sherlock de Araque e O Palhaço o que é? Carequinha
era um palhaço diferenciado, não apelava pra termos chulos nem piadas de mau
gosto. Com ou sem máscara, sabia como provocar riso fácil com seu estilo
familiar, fosse no palco, picadeiro, cinema ou televisão. Destes dois últims,
ele já estava fora fazia tempo. Do cinema porque não havia mais espaço para
filmes inocentes. Da televisão porque o mau gosto dá espaço para comediantes
medíocres como Tiririca (apenas para citar o pior exemplo).
Com a morte de Carequinha no dia
05 de abril de 2006, me veio a lembrança do palco do Cine Argus, onde pisaram
artistas de renome, inclusive o ilustre palhaço. Era o ano de 1967, meados de
setembro, o Argus passava por uma reforma radical. Na verdade, não era bem uma
reforma. Estávamos construindo um novo prédio por fora, enquanto demolíamos o
outro por dentro, sem parar o funcionamento. Não havia como parar, pois era a
única fonte de renda da família. Eu e meus irmãos, que já tínhamos funções
definidas na porta, bilheteria e bobonier fazíamos vezes de ajudantes de
pedreiros e carpinteiros.
Filhos de Seu Duca destelhando o cinema (Foto: Chico Carneiro)
Amílcar e Zé Carneiro à esquerda (Foto: Chico Carneiro)
Zé Carneiro e Amílcar à direita, torcendo para não chover (Foto: Chico Carneiro)
À medida que as obras avançavam,
o antigo prédio ia sendo demolido. Chegamos a dar sessões com parte do salão
descoberto, rezando para não chover. Paralelo a isso, havia uma crise
financeira que dificultava a vinda de bons filmes. Eram constantes as falhas na
programação, o que obrigava meu pai a aceitar qualquer tipo de filme ou shows
que aparecessem. Às vezes, o show não dava para pagar a despesa, rateava-se o
apurado entre os artistas, os músicos e, claro, o dono do cinema. Estava
garantido o almoço do outro dia. Assim, ia se levando a dura vida de exibidor
do interior.
Apareciam alguns artistas que
agradavam e levavam muita gente ao cinema como o Professor Liz José Marques,
hipnotizador que fez muito sucesso na cidade. Ministrou até cursos de
hipnotismo no auditório do Argus. Surgiu também um exibidor itinerante com o
filme do Teixeirinha Coração de Luto.
Se o termo “brega” existisse na época, Teixeirinha seria o rei do “Bregaucho”.
O filme ficou em cartaz por uma semana, dando um certo equilíbrio nas finanças.
Mas, logo seguiram as
dificuldades. Obras lentas, programação escassa. Certo dia, apareceu um
empresário do Sul. Queria acertar um show no meio da semana com o Carequinha e
sua trupe que estava em turnê pelas capitais do Norte e queria aproveitar os
dias de folga para apresentações nas cidades próximas a Belém, prática muito
usada ainda hoje por empresários do setor. O salão estava descoberto, havia
risco de chuva, de prejuízo também, já que o empresário não abria mão do cachê
fixo de um milhão de cruzeiros. Meu pai já tinha experiência de renomados
artistas que deram grandes prejuízos. Anos antes teve que recorrer a dinheiro
emprestado para cumprir um contrato com Zé Trindade.
Depois de uma manhã inteira de
negociações, ficou acertado que o grupo faria uma apresentação à tarde e outra
à noite. Nossa maior preocupação era com a chuva que, felizmente, não veio. O
show foi um acontecimento marcante na cidade. Carequinha deixou a multidão
maravilhada, se derramando em risos e aplausos. Na bilheteria tudo era festa, a
renda superou as expectativas, renasceram as esperanças daquele exibidor
teimoso que insistia em dizer “Nada substitui um bom espetáculo”.
- Tá certo ou não ta?
Seu Duca e Palhaço Carequinha (Foto: Acervo Família Carneiro)
E ainda teve nos tempos do Tele cath, onde pontificavam figuras famosas como Ted Boy Marino, Verdugo, Indio Paraguaio e com poucos televisores na cidade, o jeito era transformar-se em televizinhos, como eram chamadas as pessoas que "abicoravam" nas janelas das casas providas desse aparelho mágico. Pois bem, a participação do Cine Argus nesses eventos, foi a participação de uma troupe de lutadoras, encabeçadas com uma que se intitulava tia do Eder Jofre, famoso pugilista campeão mundial de boxe. Foi armado um ringue no palco, onde as lutadoras faziam seus "tacles", suas tesouras voadoras, tudo com muita técnica. Mas a tal tia do Eder, cometeu a asneira de provocar a paltéia, convidando um homem para lutar com elas, e, entre eles estava uma figura folclórica, famoso pela sua valentia, chamado Paulo Barbosa, ou "Paulo Mata Velha" como era conhecido. O Paulo pulou para o ringue, e sem técnica nenhuma, mandou ver, distribuindo tabefes, sopapos e trampescos de toda ordem. Resumo da ópera: Ao fim e ao cabo, tinha lutadora, escangotada pendurada nas cordas do ringue.
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